Alta dos casos de câncer entre jovens tem relação com alimentação e estilo de vida, defendem especialistas

Sedentarismo, tabagismo e consumo de álcool em excesso são fatores que contribuem para elevação das estatísticas

Por Bruno Brito
14/04/2024 às 11h00
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Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil

Os recentes diagnósticos de câncer das cantoras Preta Gil e Simony, da princesa Kate Middleton e do cantor Anderson, do Molejo, são apenas alguns exemplos que evidenciam o número cada vez maior de pessoas jovens, com idade inferior a 50 anos, com a doença. Na avaliação de especialistas ouvidos pelo Portal M!, a má alimentação, a falta de atividade física, o tabagismo e o consumo de álcool em excesso são alguns dos fatores que têm contribuído para a elevação destes números.

Entre 1990 e 2019, a taxa de diagnósticos de câncer quase dobrou (+80%) entre as pessoas com idade inferior a 50 anos em todo o mundo, segundo um estudo publicado em 2023 pela BMJ Oncology, centrado nos 30 tipos mais comuns da doença. O fenômeno, que se observa especialmente nos países desenvolvidos, também se reflete no aumento das mortes por câncer entre menores de 50 anos. Em 30 anos, este número aumentou 28%. Entre os jovens detectou-se, em especial, um aumento dos cânceres gastrointestinais (cólon, esôfago, fígado).

De acordo com a oncologista clínica da Oncologia D'Or e membro da diretoria executiva do Grupo Brasileiro do Oncologia Torácica (GBOT), Samira Mascarenhas, a questão da alimentação tem influência direta no aumento de casos, sobretudo em função da ingestão de alimentos ultraprocessados.

"Deve-se buscar uma alimentação equilibrada, rica em frutas, verduras, leguminosas, cereais e um  mínimo de carne vermelha. Os alimentos ultraprocessados são uma preocupação, pois vêm sendo consumidos em maior quantidade e mais precocemente pelas crianças", explica.

Foto: Divulgação

Características da condição entre os jovens

A especialista também detalhou que a gravidade do câncer entre pessoas mais jovens depende do tipo de tumor e do estadiamento em que foi diagnosticado, e ressaltou que existem diversos fatores associados que são avaliados para classificar a doença.

"As chances de cura dependem do estadiamento em que for diagnosticado. Quanto mais precoce for descoberto o tumor, maior é a chance de cura", aponta.

Estilo de vida é fator importante

No caso dos cânceres gastrointestinais, as causas da elevação da incidência estão ligadas ao estilo de vida, como o elevado consumo de álcool, tabagismo e uso de vape, obesidade e sedentarismo. Conforme a oncologista, um exemplo é o aumento do número de  diagnósticos de câncer de intestino em pacientes jovens. Por conta disso, houve uma mudança da indicação do rastreamento.

"A indicação de se fazer rastreamento com exame de colonoscopia baixou para 45 anos. Os principais fatores de risco para câncer de intestino são obesidade, consumo de álcool, sedentarismo. A atividade física precisa ser realizada em torno de 150-300 min por semana. A dieta entra como fator muito importante, o consumo excessivo de ultraprocessados, carne vermelha,  pode contribuir para o aumento do risco. Fora esses fatores, existe o fator de risco hereditário, história familiar, história pessoal de pólipos, além da própria idade, sendo o envelhecimento um fator de risco", pontua.

Já o oncologista da equipe da Oncoclínicas na Bahia, Eduardo Moraes, ressalta que apesar de estar comumente associado ao histórico familiar, tem sido comum ver casos de pessoas jovens acometidas pela condição, mesmo sem qualquer fator hereditário.

"E o que a gente vê realmente são essas mudanças de hábitos de vida, principalmente hábitos, vamos dizer assim, ocidentais, né? A gente já não come como nossos avós, como nossos pais, como a gente já não vive do mesmo jeito. Tudo isso tem influência grande no desenvolvimento de câncer precoce", enfatizou.

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Ainda segundo o especialista, além dos cânceres gastrointestinais, o hábito de vida também está relacionado ao maior número de doenças hematológicas, como linfomas e leucemias.

"Também se aplica, mas em menor intensidade. Linfomas e leucemias têm dois picos. Você tem um no jovem e você tem um no idoso. E essas doenças estão mais associadas também a questões genéticas. Exposição principalmente a radiação, a substâncias químicas. São pessoas que trabalham em contato direto com substâncias químicas, produtos associados ao petróleo, e por isso tem muito risco maior", explicou o médico.

Sinais de alerta

Já sobre os sinais de alerta para o câncer, o oncologista explica que eles são os mesmos tanto para os jovens como para os adultos. No entanto, ele ressalta que, no início, a condição tende a apresentar poucos sintomas, o que pode atrapalhar o diagnóstico.

"Quando um jovem, por exemplo, vai ao médico aos 35, 40 anos, com sangue nas fezes, o que você pensa? Uma hemorroida, que é uma coisa mais comum. Você não vai pensar, como primeira opção, no câncer de intestino. Já se você vai ao médico aos 50 anos, você já pensa na possibilidade de ser um câncer", observou Eduardo.

De acordo com ele, sintomas como perda de peso e perda de apetite podem sem indícios de câncer mais avançado. Já no caso do câncer de mama, a presença de nódulos é comum, sobretudo, entre os mais jovens, em função dos hormônios.

Já a oncologista Samira Mascarenhas listou sintomas como sangramento nas fezes, tosse persistente e mudança de características de lesões na pele. Ela enfatizou que esses sinais indicam a necessidade de ir ao consultório médico. "Qualquer sintoma de aparecimento recente deve levar a pessoa a procurar um médico para investigar a causa", reforçou.

Exames preventivos

Outro ponto importante são os exames preventivos essenciais para o rastreamento e diagnóstico precoce da doença entre os jovens. Conforme a médica, além da alimentação saudável, prática de atividade física, consumo moderado de álcool, evitar o tabagismo e a exposição solar sem proteção adequada, a vacinação contra HPV é importante, porque também é uma forma de prevenir câncer.

Samira também recomenda a realização de colonoscopia a partir dos 45 anos, além do preventivo ginecológico para toda mulher que tem ou já teve atividade sexual, especialmente dos 25 aos 59 anos de idade.

"Mamografia deve ser realizada para mulheres acima de 40 anos anualmente. E pacientes que fumam ou deixaram de fumar nos últimos 15 anos, que tenham entre 50 e 80 anos, e que fumaram pelo menos 20 anos/maço, devem ser submetidos a tomografia de rastreamento de câncer de pulmão", explicou.

Campanhas de conscientização voltadas aos mais jovens

Por fim, o oncologista Eduardo Moraes também defendeu que as campanhas de conscientização em torno do câncer também sejam focadas no público mais jovem. Segundo ele, "cada vez mais essas campanhas devem falar com esse público mais novo".

"É passar essa informação sem passar medo. O câncer é uma doença como outra qualquer. Ela pode ser prevenida, e quando detectada [de forma] precoce, a chance de cura é de mais de 90%. Então, é importante saber quais são os fatores que aumentam o risco de câncer, saber educar as crianças. É algo que cabe muito aos pais estarem estimulando a atividade física e a dieta saudável a seus filhos. Tanto para si, como para seus filhos", enfatiza.

 

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