Especialista diz que infraestrutura de carregamento não acompanha venda de carros elétricos

Na avalição de Anderson Magalhães, o atual cenário deve evoluir a partir de uma maior demanda

Por Bruno Brito
05/05/2024 às 08h00
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Foto: José Cruz/Agência Brasil
Foto: José Cruz/Agência Brasil

A chegada da Build Your Dreams (BYD), uma das maiores fabricantes de carros elétricos do mundo,  ao Polo Industrial de Camaçari acendeu o debate sobre a infraestrutura necessária para atender este mercado na Bahia.  O Brasil registrou o marco de 93.927 carros elétricos vendidos em 2023, 91% a mais em relação ao consolidado de 2022, quando 49.245 veículos do tipo foram comercializados. Os dados foram divulgados pela Associação Brasileira de Veículos Elétricos (ABVE) em janeiro deste ano. 

O Portal M! ouviu o especialista em automóveis e empresário do segmento de veículos há mais de 20 anos, Anderson Magalhães, para saber como está o cenário no Estado. Segundo ele, um dos principais pontos que evidenciam a baixa infraestrutura é o número reduzido de pontos de carregamento. Ainda segundo a ABVE, a Bahia possui 105 eletropostos.

"Existe alguns pontos de carregamento, que são carregadores rápidos, que são o Posto Escola, o Cimatec. Algumas concessionárias têm carregadores rápidos instalados por determinação da marca, como a Audi e a Porsche. Você tem em todas as concessionárias que vendem elétricos. E outras estações de carregamento que são públicas são os shoppings", explicou Anderson, que está realizando estudos de viabilidade no segmento de elétricos.

Já com relação aos eletropostos, Magalhães observou que os tipos encontrados em Salvador não correspondem ao modelo de negócio.

"O eletroposto consiste numa estrutura que vai vender a energia para que você faça o carregamento com mais facilidade, mais disponibilidade. Vai ter mais número de carregadores e com isso, você não vai precisar estar numa fila ou correr o risco de algum carro terminar de carregar e não ser retirado ou ter carregadores limitados, ou como acontece nos shoppings que têm carregadores disponíveis, instalados geralmente por marcas de veículos, mas que têm a potência de carregamento bem limitada, porque o objetivo ali é te oferecer uma comodidade e não carregar o seu carro. Além de te manter dentro do shopping, no centro de consumo que ele tem ali. Então, a carga é bem limitada, você carrega pouco em um tempo muito longo", pontuou.

Anderson também é representante da Carbiz Brasil (carbizbr), canal de conteúdo sobre o universo automotivo | Foto: Instagram/@carbizbr

Número insuficiente

Conforme o especialista, o número atual de pontos de carregamentos para a quantidade de veículos está longe de ser "equilibrado". Ele, no entanto, lembrou que se trata de um cenário que ocorre em todo o Brasil e até em outros países.

"Os Estados Unidos, que já convivem com carros elétricos fazendo parte da frota há bastante tempo, têm uma deficiência de carregadores. No Brasil, [há] iniciativas de marcas, alguns estabelecimentos e também pessoas que estão também colaborando com esse sistema, instalando carregadores na sua empresa ou na sua casa e compartilhando através de aplicativos, de compartilhamento como o Plugshare, onde você localiza um carregador. Mas, com certeza, está muito aquém do que é necessário, até porque nesse momento, especificamente aqui em Salvador, nós temos um crescimento das vendas que é muito mais acelerado do que a infraestrutura para carregamento", alerta.

Na avalição de Magalhães, o quadro só deve melhorar a partir de uma maior demanda. "A compra do carro elétrico se baseia na premissa de que você deve ter um carregador instalado na sua casa, em uma garagem sua, para que à noite você possa plugar o carro e carregar. Essa infraestrutura  ainda vai demorar um tempo para ficar melhor, ideal".

Outro fator que deve contribuir para a melhoria da infraestrutura no estado é a chegada da BYD. Para o empresário, a montadora deverá patrocinar pontos de recarga que vão gerar facilidades para o uso dos veículos com mais autonomia.

"Até porque deve ser um interesse a utilização desses carros como frota de carros de governo, polícia, aplicativo. Então, para esse tipo de uso, o carregador somente à noite não resolve, porque ele pode ter que fazer uma carga extra ao longo do percurso", explicou.

Principais gargalos do mercado de elétricos

Além das questões envolvendo as recargas dos veículos elétricos, há outros gargalos, como o custo elevado das baterias. Anderson também pontuou que, apesar de ser um carro de energia limpa, a produção da bateria não é.

"A principal delas está no custo elevado de baterias, a sua produção, que não é limpa. Você tem essa questão ainda de poluição, de extração de minério para a produção de bateria. As baterias precisam de investimento para que elas diminuam o tamanho e se tornem mais eficientes. Como está hoje, você tem, por exemplo, a bateria custando quase o valor do carro. É inviável imaginar que você pode ter algum reparo e ter um custo tão elevado", alertou. 

Outro gargalo, conforme o especialista, está ligado à autonomia dos veículos. Isso porque a infraestrutura nem sempre possibilita que você tenha carregadores com fácil acesso.

"Por mais que você não rode mais de 100 km por dia no uso particular, você fica ansioso pela questão de autonomia. Por exemplo, tem prédios e condomínios mais antigos que não possibilitam a instalação e a transferência de energia. Essa transferência é uma ação que gera muito calor e é perigoso, é complexo. Então você tem que investir muito em materiais de qualidade, o que encarece o carro, encarece o carregador e consequentemente a carga", disse.

Principais vantagens

Já entre as principais vantagens, está o baixo custo do quilômetro rodado com os carros elétricos. Isso porque, se comparado com o abastecimento de combustível, o gasto com a rede da energia para a recarga do elétrico tende a ser menor.

"Mesmo que você use a rede de energia, não tenha placa de energia solar na sua casa, não exagere sua própria energia, você utilizando a rede para abastecer seu carro é muito mais barato do que um carro a combustão", afirmou Magalhães.

Outra questão importante e que se destaca é a manutenção simplificada desses veículos. Como exemplo, o empresário citou a troca das pastilhas de freio, que tendem a ser feitas a cada 30 ou 40 mil quilômetros nos carros a combustão, e são realizados a cada 100 mil quilômetros nos elétrios. 

"Outros componentes que não existem no carro elétrico simplificam muito a manutenção. A própria questão de emissão é uma coisa interessante também para se pensar quando utilizado, por exemplo, em transporte de mobilidade. Outro benefício é a eficiência energética do carro elétrico. No carro a combustão, você consegue extrair 40% ou 45% de toda a potência, energia que é gerada ali. Já no elétrico, essa conta é mais de 80%. Você tem uma eficiência energética muito alta no carro elétrico, além das possibilidades que geram em relação ao carro a combustão".

Aumento nas vendas

Apesar das vendas dos elétricos já estarem em alta no país, Anderson acredita que a chegada da BYD na Bahia vai propiciar um aumento ainda maior no Estado. De acordo com ele, isso corre porque as montadores possuem estratégias mais sólidas e consolidas, além de produtos superiores do que há alguns anos.

"Tudo o que as marcas chinesas não conseguiram ser nos produtos a combustão, elas conseguem fazer no elétrico. Elas têm desenvolvimento antecipado, elas que foram pioneiras em diversas das tecnologias. A maior venda de carro elétrico no mundo é na China, então eles estão vivendo isso que a gente está começando agora, há alguns anos, dá uma dianteira para eles, dá uma vantagem. E os produtos que estão sendo apresentados realmente são impressionantes. A chegada da BYD aqui traz esse poder econômico da China, a validação que os chineses têm com o carro elétrico e, além de tudo isso, há um impulsionamento muito grande de vendas aqui", pontuou.

O especialista também lembrou de iniciativas já tomadas para elevar o uso destes veículos, como a isenção de IPVA entre os carros elétricos, sancionada pelo governador Jerônimo Rodrigues (PT) em dezembro do ano passado.

"Há uma negociação para bonificar parcialmente o IPVA do carro híbrido. Então, há sim um panorama para que a BYD aqui dê um boom de vendas, vendendo mais do que outras marcas, porque ela vai ter uma estrutura grande de fábrica e, principalmente, ela se mostra dedicada ao estado. Ela se mostra muito alinhada aqui com o governo do estado. Então, espera-se que ela seja líder em vendas no Brasil. Mas aqui na Bahia [espera-se que] esse número seja ainda mais expressivo na quantidade de veículos", concluiu.

 

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